sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Os Pagãos Hoje

Venerar as antigas divindades pode parecer estranho nos dias de hoje. Por que os Pagãos veneram essas antigas e empoeiradas imagens? Nós veneramos nossos deuses porque eles não são artefatos arqueológicos, mas sim energias vivas de grande poder. Eles superam qualquer imagem externa de suas estátuas retiradas de templos antigos que agora estão em museus ao redor do mundo. O mais importante é que sobrevivem na memória humana, no inconsciente coletivo, onde armazenamos nosso conhecimento religioso e experiências.

As crenças pagãs são baseadas em ensinamentos, mitos e sagas que sobreviveram através de centenas de anos. O Paganismo nunca morreu. Apesar de nossas antigas crenças pagãs terem sido vistas apenas como mitos ou contos de fadas, as histórias que ouvíamos de nossos pais ou na escola, pareciam não ter importância. No entanto, o fato de considerarmos e repassarmos esses mitos, mostra que eles tinham importância sim! De geração em geração, esses mitos e lendas têm sido passados de boca em boca. Eles foram cantados pelos Gregos nas águas do Mar Egeu, pelos bardos Nórdicos, pelos bardos Irlandeses... tanto que eles podiam penetrar campos de batalha sem serem atingidos, pois eram imunes a qualquer violência ou impunidade.

Os mitos têm sobrevivido porque falam conosco na linguagem da noite, dos sonhos, através de simbolismos e alegorias. Eles incitam a mente consciente porque não os compreendemos totalmente; bem sabemos que através de seus simbolismos existem verdades imortais. São como grãos de areia dentro de uma concha de ostra. Nossas mentes sempre operam através deles, muito mais que nossa consciência possa imaginar. Eles persistem e retornam quando lembramos de histórias há muito esquecidas. Eles são relembrados em filmes de fantasia ou de ficção científica que vendem aos milhões ao redor do mundo. E, como o grão de areia em uma ostra, às vezes produzem pérolas de grande valor – a pérola do conhecimento.

Mitos são importantes porque neles está contida a sabedoria espiritual, não de um indivíduo, mas de muitas pessoas em um longo período do tempo. Eles não são as revelações religiosas de um determinado homem que os fez e refez até torná-los distantes de sua forma original perdendo toda sua verdadeira essência. Eles são os sonhos vívidos dos deuses que ainda respiram, enviados para mostrar nosso verdadeiro destino, o qual seria viver mais uma vez em unidade e harmonia com as forças divinas dos Céus e da Terra.

A religião pagã está a nossa volta – na paisagem moldada por gerações, nos montes sagrados ou círculos de pedras, lugares onde gerações e gerações vieram honrar e venerar os deuses de seu povo e de sua terra. É uma religião que se preserva através de suas músicas folclóricas, das suas danças em cada troca de estação. Nós fazemos nossas bonecas de palha de milho, brincamos com as maçãs no Halloween , nem sempre lembrando que estes são os remanescentes de nossos ancestrais Celtas, Germânicos e de outras tribos que delinearam as heranças do Ocidente.

Assim como entramos em um novo milênio, nós estamos presenciando um renascimento das antigas tradições espirituais. Os antigos Deuses e Deusas adormeceram por um período, mas agora estão despertando. O Paganismo é mais uma vez praticado em toda Europa, América, Austrália, Nova Zelândia... É a religião oficial da Islândia! Essas tradições não são unicamente praticadas na Europa. Pessoas no mundo inteiro estão rejeitando novas religiões e estão retornando ao conhecimento de nossos ancestrais.

Alguns Pagãos veneram os deuses de seus ancestrais, ou do lugar onde vivem. Também podemos estranhamente estar ligados à deidades que não fazem parte de nossa terra ou de nossa herança racial. Muitas pessoas no mundo veneram deidades egípcias, por exemplo. Muitos Pagãos veneram divindades de diversas religiões, de diferentes tradições. Eles podem adorar a Grande Mãe, observando as diferentes formas nas quais essa divindade é venerada em vários lugares do mundo. Outros podem venerar Odin ou Cernunnos.

Alguns adoradores dos deuses pagão definem-se simplesmente como Pagãos, ou adoradores da Deusa, ou membros da Velha Religião. Outros seguem tradições particulares dentro do próprio Paganismo. Um dos mais conhecidos é o Druidismo. Os Druidas eram os sacerdotes dos Celtas, também eram grandes poetas e curadores. Existem muitos grupos que estudam as habilidades do Druidismo e veneram seus deuses. Outros autodenominam-se Odinistas, seguidores de Odin, ou Asatru, seguidores dos grandes deuses do norte da Europa no qual sobressai-se Odin. Outros colocam-se como seguidores da Arte, ou Bruxaria (Witchcraft ou Wisecraft). Não a Bruxaria que, dizem, segue as forças negras ou de adoração ao Diabo, mas sim a verdadeira arte dos sábios daquele povo. Este é um caminho abençoado de cura que venera os deuses, que pratica magia, artes de cura, de autoconhecimento e de Visão – as habilidades psíquicas inerentes a todos nós tem sido suprimidas nesses últimos séculos.

Alguns denominam-se Wiccanianos, uma forma de Arte que venera a Grande Deusa e seu consorte, o Deus com Chifres. Mas também inspira-se nos mistérios da religião do antigo mundo que ensinou aos nossos ancestrais o caminho para o autoconhecimento e para a sabedoria dos deuses.

Alguns Pagãos praticam os mistérios dos antigos Gregos, ou Romanos. Na América do Norte muitos buscam inspiração na espiritualidade de ancestrais nativos, talvez simplesmente porque sintam necessidade de resgatar sua herança porque acreditam que a espiritualidade está enraizada na herança de sua terra, ou da terra para o qual imigraram.

Mesmo que a forma de veneração dos antigos deuses seja diversificada, isso é o suficiente para que sintam-se integrantes de um movimento espiritual que está em evolução, o Paganismo.

A Mãe das Estrelas

...”Ouça as palavras da Deusa estelar, cujo corpo engloba o universo e a poeira dos seus pés forma as hostes celestes”. O Mandamento da Deusa, de Doreen Valiente.

A humanidade sempre sentiu fascínio pelas estrelas e ao longo dos tempos as constelações ofereceram imagens e sabedoria para a criação de mitos e lendas. Os nomes atuais das estrelas são, na sua maioria, de origem grega e romana, porém muito antes destas civilizações, os povos nativos exploravam a vastidão do céu e criavam seus próprios mitos e arquétipos divinos.
Os nativos norte-americanos consideravam a “estrela matutina e vespertina” (nomes de Vênus nas suas diferentes aparições em função da época do ano) como representações do princípio masculino e feminino. Um motivo comum nas suas lendas era a metamorfose de uma Mulher Estrela em uma linda mortal e seu desaparecimento depois de casar com um humano. Outros mitos chamam as estrelas de Filhos do Sol e da Lua, que, por temerem o Sol que engolia seus filhos, desapareciam de dia e voltam para dançar junto da sua mãe, a Lua, na chegada da noite. Os povos siberianos acreditavam que as estrelas são janelas de cristal pelas quais os deuses olham para a terra, o céu sendo uma grande tenda. A Via Láctea - que marca o centro da nossa galáxia - é descrita por alguns mitos como uma estrada, rio ou ponte entre os mundos.
Os índios navajos dizem que ela foi formada pelo coiote que espalhou pedras brilhantes no céu, formando a ponte que liga o céu à terra. Já os maias achavam que ela era a estrada pela qual as almas iam para o mundo subterrâneo. No antigo Egito a luminosa estrela Sirius era alvo de veneração, seu aparecimento no céu coincidindo com a cheia do rio Nilo que trazia fertilidade e prosperidade. Os templos de Ísis, Hathor e Nut eram orientados para Sirius, que era o local de repouso das almas dos faraós e sacerdotes. Ísis era tradução grega do nome Au Set ou Sothis, equivalente de Sirius. A constelação Canis Maior a qual pertence Sírius é formada por 7 estrelas que deram origem aos 7 aspectos de Hathor e à serpente com 7 cabeças. A deusa árabe Al-Uzza também é associada com Sirius; os mitos semitas relatam a descida das deusas Ishtar e Astarte do planeta Vênus. Os títulos Rainha Celeste e Estrela Guia foram atribuídos a estas deusas, bem como à Inanna e “herdados” depois por Maria.Inanna era descrita vestida com uma túnica de estrelas e um cinto formado pelo zodíaco.
Existem inúmeros mitos sobre as Plêiades, chamadas também de Sete Irmãs, “A galinha e seus pintinhos” ou “As choronas”, sua aparição sendo prenúncio da estação de chuvas, um marco importante para navegação e início do Ano Novo em vários lugares.. Elas formam um pequeno grupo na constelação de Touro, seis sendo visíveis a olho nu. Em contraste com seus efeitos míticos benéficos, na astrologia lhes é atribuída uma influência nefasta, presságio de cegueira para aqueles que nasceram debaixo da sua influência (grau 29 de Touro). Mitos celtas e maias atribuem a construção dos sítios megalíticos, círculos de menires e pirâmides a um enigmático Povo das Estrelas e aos viajantes vindo das Plêiades.
A Mãe das Estrelas é uma divindade cuja antiguidade e complexidade foge à nossa compreensão racional. Ela abarca toda a vastidão e diversidade do universo, regendo o tempo e a ausência dele. Ao mesmo tempo é gentil e terrível, simbolizando criação e destruição, o milagre do nascimento de uma estrela e a explosão violenta de uma super nova. Tanto é a luz difusa e longínqua das nebulosas, quanto o calor do Sol, o brilho da Estrela Polar ou o mistério dos buracos negros. Para conseguir alcançar o seu misterioso e profundo poder, precisamos nos distanciar dos arquétipos e diversos nomes a Ela atribuídos ao longo dos tempos.
Podemos apenas imaginá-la como uma figura nebulosa formada pelas galáxias, cujos cabelos ondulam no movimento dos cometas e os seus passos são marcados pela poeira estelar. Seus olhos brilham como estrelas super novas, seu sorriso esquenta como os raios do Sol e Ela protege os viajantes da Terra, do mar e do espaço com suas asas radiantes. Seu elemento é a escuridão que abrange e conforta, mas também é a luz que brilha e guia. Seu halo cintila com cores estelares, do ultravioleta ao infravermelho, passando pelo azul, amarelo, vermelho ou simplesmente branco. Pode ser vista como uma Deusa Tríplice personificando a passagem do tempo ou apenas Mãe, pois Ela é a Fonte de tudo, o começo e o fim.
Para ouvir Sua voz no nosso coração e sentir o Seu abrangente abraço, precisamos apenas olhar para o céu estrelado e refletir sobre o movimento eterno e infinito dos planetas, estrelas, constelações e galáxias, círculos dentro de círculos, mundos dentro de mundos. Sentir a nossa pequenez de simples átomos do Seu corpo, mas também a nossa grandeza espiritual por sermos Suas filhas. Iremos encontrá-la se mergulharmos dentro de nós, na nossa alma, percebendo-a como nosso Sol e doadora de vida, a nossa estrela Guia. E, se quisermos refletir suas bênçãos, devemos irradiar nossa própria luz, como pequenas centelhas da sua gloriosa e radiante chama. Pois ela é a Mãe de todos nós, o Alfa e Ômega do Todo, a Senhora Estelar primordial.

Cornucópia da Abundândcia

 

A palavra é originária do latim (cornu copiae = chifre da abundância). Trata-se de um símbolo relacionado à fartura da alimentação e à abundância em geral. Na mitologia grega consta que Almatéia (ninfa do Olimpo) alimentou Zeus com leite de cabra. Em toca desse favor, Zeus ofertou-lhe um chifre desse animal, que tinha o poder de dar à pessoa que o possuísse tudo o que quisesse. Deidades da mitologia grega – especialmente a deusa Fortuna - eram por vezes representadas com o chifre repleto de bens. 
Cornucópia da Abundância

O Chifre tradicional da Abundância, ou Cornucópia, é um símbolo de generosidade, boa colheita e tem implicações mágicas bem-definidas. O próprio chifre é um símbolo fálico, representante do Deus. O interior do chifre simboliza o útero, especialmente quando está cheio de generosidade da terra fértil, e representa a Deusa.

Faça ou compre uma cornucópia. Encha o chifre de frutas, flores, grãos e moedas, de forma que eles sejam derramados sobre o Altar. Some outras coisas mágicas, como folhas de carvalhos ou bolotas, avelãs ou cartas de Tarô. 

 Constelações da Bruxaria

Livro: Os Pilares de Tubalcaim
Autores: Michael Howard e Nigel Jackson

Capítulo XX
Órion e o Grande Caçador

No século XIII, o escritor Saxo Gramaticus escreveu um relato sobre a vida e a era do príncipe Arnleth ou Hamlet da Dinamarca. Arnleth era uma variante de Arnlodi, o ser sobrenatural nos mitos nórdicos sobre a criação, cujo moinho mói as estrelas. Esse moinho [parece ser a Estrela Polar] ficava em uma ilha protegida por um grupo de mulheres gigantes chamadas As Nove Damas [parece ser a Coroa Boreal]. Arnleth, o pai, era chamado de Orvendell ou Earendell e foi descrito como o primeiro de todos os heróis a nascer. Earendell foi também um guerreiro e caçador que lutou contra os gigantes de gelo nórdicos, equivalentes aos Titãs. Ele era um amigo do deus do trovão Thor e um hábil arqueiro. Ele foi comparado com Wayland, o Ferreiro, Robin Hood e Órion, o caçador. O pai de Hamlet é uma figura um tanto quanto mítica, e dizia-se que ele tinha sido um ser humano que se transformou numa estrela. Essa é uma metáfora para o mortal atingindo o status divino ou união com Deus. Entretanto, o enredo se torna mais denso quando uma fonte anglo-saxônica descreve Earendell como o anjo mais brilhante, que foi enviado pelos homens pela Terra Média. Em alguns relatos, ele é descrito como a verdadeira refulgência (brilho ou iluminação) do sol que ilumina todos os dias para todo o sempre. Em eras anglo-saxônicas, ele foi associado a Vênus como a estrela da aurora ou estrela da manhã e ao arcanjo caído [segundo estes autores, encarnado. Ou seja, ele caiu na Terra, e não no Inferno.] Lúcifer. Em um comentário obscuro sobre Earendell, I. Gollanz, em seu livro"Hamleth in Iceland" (1898), citado por de Santilla e von Dechend (1977: 36), parece sugerir que Vênus, em seu brilho pleno no céu, era a Estrela de Belém, e compara o Crito criança com o deus Sol [por que será que isso me lembra Mitra?]No passado, o viajante sempre celebrava o surgimento de Vênus antes da aurora porque era sinal de que o sol logo surgiria para um novo dia 
Earendell é a forma do arqueiro divino arquétipo, cujas representações terrestres incluíam heróis folclóricos, tais como William Tell. Na verdade, a história de Tell acertando uma maçã na cabeça de seu filho foi a princípio creditada a Earendell. [Não sei porque, mas isso está me lembrando que Diana acertou uma flecha na cabeça de Órion, que nadava lá pelo horizonte.] Em um dos episódios mais famosos dos mitos de Robin Hood, ele compete disfarçado em um campeonato de arco-e-flecha. No cosmos, Earendell é associado à constelação de Órion e suas conexões Luciferianas. De Santilla e von Dechend chamam essa figura gigantesca de filho de Deus, o floresteiro e Grande Urso, todos nomes com conotações interessantes. Ele caça um búfalo ou um veado ao longo do caminho celestial da Via Láctea, que também é conhecida em mitos da Europa do Norte como Wodenwaeg ou Caminho de Woden. Earendell-Órion é o arqueiro que persegue seus animais totens pelo céu noturno. Adrian G. Gilbert o viu como outra forma de Herne, o Caçador, o deus bruxo que também está associado a Woden e Robin Hood. Nos contos folclóricos populares ingleses, Herne é um floresteiro a serviço real na floresta de Windsor. Um dia, enquanto caçava com o rei, ele o salva do ataque de um veado ferido. Herne mata o animal, mas, ao fazer isso, sofre uma ferida mortal. Um mago que convenientemente passava por ali instruiu seus colegas a cortar os chifres do veado e colocá-los na cabeça de Herne. Ao fazerem isso, ele milagrosamente ressuscita dos mortos. [Puxa. Que xamânico.]O rei recompensa Herne por ter salvado sua vida fazendo dele seu diretor-chefe. Infelizmente seus colegas ficaram com ciúmes, ou ele foi repreendido por caçar ilegalmente, e, mais tarde, um Herne deprimido se enforca em um carvalho atingido por um raio na floresta. Daquele dia em diante, seu espírito com chifres assombra os arredores do carvalho com uma matilha de sabujos espectrais. Em muitas formas da bruxaria tradicional, o Deus Chifrudo em seu aspecto de inverno é representado
como o Senhor da Grande Caçada. Tanto a tradição folclórica inglesa quanto a alemã dizem que o líder da Grande Caçada é Woden ou Herne [às vezes ela tem uma líder feminina, chamada Diana ou Holda ou Bertha ou Perchta]. No interior desses países, ela é por vezes chamada de Caçada de Caim. [Segundo esses autores, o fundador da Bruxaria é o ferreiro Tubalcaim, às vezes chamado Tubalo, às vezes Caim, às vezes Hefestos.]Na mitologia greco-romana, Órion foi amado por Diana, a deusa lunar da caça. Todos os dias, o jovem caçador costumava percorrer a floresta com seu fiel cão Sírio logo atrás. Um dia ele encontrou um grupo de ninfas de Diana dançando alegremente em uma clareira da floresta. Elas eram, na verdade, filhas do Titã conhecido como Atlas. Órion imediatamente as perseguiu [que rapaz afoito], mas elas se embrenharam ainda mais para dentro da floresta e foram perseguidas pelo caçador de sangue quente. Em uma tentativa de escapar de seu cerco, as ninfas pediram o auxílio de sua senhora Diana. Elas foram instantaneamente transformadas em sete pombas brancas e voaram pelo céu. Elas se tornaram as sete estrelas da constelação de Plêiades. Órion então se apaixonou por uma princesa mortal chamada Mérope. Seu pai consentiu o casamento deles, contanto que Órion realizasse um feito heróico para ganhar a mão dela. Órion, em vez disso, planejou abduzir Mérope e casar-se com ela em segredo. Quando seu plano foi frustrado, Órion foi cegado (como tradicionalmente foram Earendell, [São] Longuinho e Hodur, o assassino de Baldur) como punição e também perdeu sua futura noiva. Cego e impotente, Órion vagou de um lugar a outro esperando encontrar alguém que pudesse lhe devolver a visão. Um oráculo disse a ele para viajar para o leste e expor seus olhos ao sol nascente. Ele assim o fez e foi curado.
Em uma versão alternativa, a deusa da aurora Eos ou Eostre [esse não é um nome alemão?] se apaixonou pelo caçador cego. O irmão dela, Hélios-Apolo, restaurou sua visão. Em uma terceira versão, Órion perambulou na caverna de um cíclope, um dos membros dos Titãs, a raça de gigantes. Como disse o poeta Longfellow: "Ele procurou o ferreiro em sua forja. O cíclope disse a ele para escalar uma montanha e curar seus olhos vazios no sol nascente e sua visão seria então restaurada." Uma vez curado, Órion retornou para a floresta e sua vida de caçador. Ali ele conheceu Diana, e eles se apaixonaram. Para azar do casal devotado, Apolo tinha ciúmes de sua irmã [Alguém mais está pensando em Aradia, o Evangelho das Bruxas? Levante a mão.] e tramou assassinar Órion. Em um incidente muito parecido com a morte de Baldur, Apolo convenceu Diana a demonstrar suas habilidades com o arco. Ele a desafiou a acertar um ponto negro muito distante boiando no mar. Diana atirou e percebeu tardiamente, quando a flecha atingiu o alvo, que o ponto negro era Órion que nadava. Diana jurou que seu amor jamais seria esquecido e colocou a alma de Órion entre as estrelas do céu. Ali ele continua a caçar com seus companheiros animais, uma lebre e dois cães de caça. São eles: a Cão Maior, contendo a estrela Sírio, e a Cão Menor, contendo Procyon. Na mitologia egípcia, Sut-har (Seth-Hórus) era associado a Órion e Sirius, representado por um cão e um lobo.
Gilbert (1996) também associa Órion com o poderoso rei caçador Nimrod, descendente dos Vigias [os Guardiães], construtor da cidade pioneira e da Torre de Babel. Ele foi descrito pelo demonologista católico Montague Summers como um bruxo gigante de grande força. Como Nimbroth ou Nebroh, ele foi adorado como deus pelos Amonitas. Na Idade Média, o grimório do papa Honório invoca Nambroth como poder demoníaco de Marte. Isso o relaciona com Samael, o governante angelical de Marte, Azrael-Azazel e, claro, Shemyaza, pendurado no portão estelar de Órion.
A constelação de Órion parece ter tido alguma importância para os antigos egípcios, se for possível acreditar nos autores modernos. Em 1994, Robert Bauval e Adrian Gilbert publicaram o resultado de sua recente pesquisa nas pirâmides e seus significados. Eles ligaram esses monumentos com Órion e o enterro dos faraós. De acordo com a teoria deles, as pirâmides foram construídas para formar um mapa de estrela na paisagem, refletindo o céu noturno acima. Não apenas isso, mas também em ritos funerais, a múmia do faraó era colocada em uma câmara dentro da pirâmide em posição de uma haste para o exterior alinhada com a constelação de Órion. Um rito mágico era realizado para libertar a alma do rei para que ela pudesse tomar seu lugar como o Osíris renascido no portal estelar de Órion. Existe uma quantidade considerável de tradições estelares antigas, direta ou indiretamente, ligadas às tradições luciferianas. Por exemplo, a tradição da estrela cigana registrada por J. A. Vaillant em seu estudo "Les Roms" (Paris, 1857) descreve as constelações circumpolares como o Livro de Enoch ou Tro-Tehitio sideral original, o nome cigano para Hermes Trismegisto, de onde todos os destinos eram disstribuídos para o mundo. Isso acontecia via matrizes planetárias zodiacais ou tipos celestiais de arcanos maiores do tarô. Os informantes de Vaillant lhe disseram que o destino dispensado por essa roda de estrelas dispensava o destino das excursões da tribo de Rom. E. B. Trigg (1975) descreve que foi um ferreiro cigano que forjou os quatro pregos da crucificação. O quarto prego tornou-se tão quente que não pode ser removido da forja, e apenas três foram usados [então a Estrela Polar é o quarto prego]. Esse quarto prego foi a ruína dos Rom desde então, forçando-os a vagar pela Terra sem um lar, como o Judeu Errante, em uma tentativa de escapar de seu destino.
Os Rom também têm um relato sobre suas origens que diz que eles descendem da união incestuosa de Tubalcaim e Naamá ou Chem e Guin, o Sol e a Lua [e eu descendo dos Rom. Será que Tubalcaim foi meu avô?]. Um dos antigos títulos dos romanis era As Crianças de Caim. O monopólio cigano na metalurgia na Idade Média e possivelmente até seu comércio moderno como negociantes de sucata deriva desse mito de origem [a tribo dos Kalderash tem fama de fazer excelentes caldeirões de cobre]. As Crianças de Caim, ou povo do fogo, eram supostamente magos hereditários com poderes psíquicos, ferreiros e comerciantes de cavalos. Essas categorias se encaixam com as ocupações favoritas dos ciganos por todos os tempos.Por trás desses mitos, está a crença Gnóstica sobre como o espírito puro desanda para o ciclo melancólico e fatigante da existência material na roda do renascimento sublunar [Geoffrey Hodson, teósofo, diz que Belzebu é o responsável pela roda do Samsara], constantemente tentando retornar ao seu reino estrelado. O mundo material é o reino do Tempo e do Destino sobre o qual o Prego Polar Celestial, a Estrela Polar, reina soberano e sereno sobre o destino. A estrela Alpha Polaris é a Estrela Central ou Umbigo do Céu. Como ponto metálico ou qutub, o athame ou espada, a Estrela Polar foi forjada por Tubalo, o deus do fogo dos ciganos que corresponde a Tubalcaim_ do árabe Qyn, ou ponta de ferro (uma lanceta ou lança).
Esse arcano metálico da Estrela Polar pode estar ligado ao mistério egípcio de Bja ou os ossos de ferro meteóricos dos reis estrela envolvidos na transmutação do faraó morto em Osíris na constelação de Órion. (Bauval e Gilbert, 1994: 203-04) Seth também possui um esqueleto de ferro e, em um papiro mágico do século III de Alexandria, a cidde sagrada da tradição Hermética, ele é invocado com o "És o ponto central das estrelas do céu, você, Mestre Typhon." Typhon era o nome grego para Seth, mas também, estranhamente, um nome dado para sua mãe, a Deusa das Sete Estrelas (Ursa Maior ou o Grande Urso).O pólo celestial é o segredo por trás do simbolismo do castelo giratório de quatro lados da Deusa Bruxa. Ele gira eternamente no coração do céu e é o portal de entrada para Hiperbórea, ou a terra além do vento norte. Para o iniciado nos Mistérios, Polaris é simbolicamente a ponta da espada, a cidade de Enoch, e Caim, a Estrela de Ferro, o Umbigo Celestial e a sutura estelar no domo em forma de crânio do céu, o portal de entrada para o Outro Mundo.Sobre o centro cósmico dos céus gira a constelação de Draco, o Dragão. Na Pérsia, era o dragão-serpente Azhdaha, identificado como a Serpente Negra da Luz, Azazil-Ebas, chefe dos Inri ou anjos caídos. A Grande Estrela-Dragão enrolada sobre uma árvore eixo dos mundos é emblemática da serpente da sabedoria enrolada sobre a cruz de Tau, o selo da Arte dos Sábios. A Grande Serpente, Draconis Azhdaha, é significantemente chamada também de Thyphonis Statio ou a Estação de Typhon ou Seth. No planisfério egípcio reproduzido em Oedipus Aegytiacus de Athanasius Kircher (1652), Typhon é mostrado como um dragão escamado escarlate e verde que é equiparado com o deus mais antigo. Esse esquema de cores verde e vermelho retrata a tradição Luciferiana.
Em alguns círculos da Bruxaria Tradicional, as constelações Ursa Maior (O Grande Urso) e Ursa Menor (O Pequeno Urso) são reverenciadas como os veículos siderais do Senhor e da Senhora, o Deus Bruxo e a Deusa Bruxa. Respectivamente, eles são designados como a Carruagem de Nosso Senhor [o de Chifres] e a Carruagem de Nossa Senhora [não é a Maria]. A Ursa Maior também é chamada de Carruagem de São Gabriel. É vista como ataúde estelar, que carrega os espíritos dos mortos. Ela tem conexões duradouras com o Senhor da Grande Caçada, cujos cães são chamados de taramelas de Gabriel (possivelmente relativo à catraca ou roda.)No gnosticismo Persa-Judaico, a Ursa Maior é governada pelo touro demônio com chifres, Asmodeus, lorde da tempestade e da noite. Ele é o filho de Tubalcaim e Naamá [Vovô! ^_^], de acordo com a lenda, ou do rei Davi e Lilith, de acordo com outra. Menos conhecida é a tradição de Bruxaria de Lancashire ligando as estrelas da Grande Ursa com os Sete Assobiadores, os pássaros psicopompos espectrais cujos trinados noturnos misteriosos pressagiam a morte. Tradicionalmente, acredita-se que eles encarnam os espíritos dos judeus que ajudaram na crucificação. A punição divina deles foi vagar como pássaros tristemente voando em círuclos pelo céi para sempre. A Ursa Maior é o veículo celestial da líder feminina da Grande Caçada no folclore e na tradição da Bruxaria. Ela é Holda,Herodias ou Diana-Ártemis, a Deusa Negra e a Grande Senhora da Bruxaria européia. Isso é confirmado pelo encantamento mágico helenístico para Aktos como a cadeira da Grande Caçadora. Esses sistemas estelares girando no céu alto são os veículos cósmicos dos Velhos Poderes [Antigos Poderosos?] de onde os mistérios Cainitas-Ofitos mais-que-humanos foram originalmente transmutados e a semente dos Velhos Deuses e Dos Grandes nasceu eras atrás.

As Plêiades ou Sete Irmãs são chamadas de Galinhas da Noite no folclore europeu. Elas são sagradas para a Dama Branca do Céu (a Deusa Bruxa) no seu aspecto sétuplo, como a chama de sete línguas do candil das virgens estelares. As Plêiades traçam o caminho elíptico ao longo do céu noturno feito pelo sol durante as horas matutinas. Magicamente, seus poderes são contidos, segundo Agrippa, para aumentar a luz dos olhos (possivelmente uma referência ao mito clássico de Órion), para congregar os espíritos, aumentar os ventos, revelar segredos e coisas ocultas. A Rainha Negra de Elfame, a mais sagrada para a Mãe de Rosto Negro, é a estrela gêmea Caput Algol _ Al Ghul, em árabe, significa demônio. Ela está na constelação de Perseu, que representa o semblante maligno da górgona Medusa [em grego, a cabeça da Medusa na égide de Athena é gorgoneión, que é a mesma palavra para o rosto na Lua]. Ela é o aspecto triforme do cacho de serpentes da Deusa grega Hécate-Mormo adorada pelas antigas Bruxas da Tessália.
Essa deusa está ligada à face negra ou ao lado escuro da Lua, e ela protege os portões do mundo subterrâneo. Na demonologia judaica, Algol, um sistema estelar binário rotativo, é conhecido como a Cabeça de Satã e a Estrela de Lilith. O explorador vitoriano sir Richard Burton notou a associação dela com Lilith, a lâmia, o dakini do Hinduísmo, o utug caldeu e o gigim ou demônio do deserto. Agol [é Agol mesmo ou o cara queria dizer Algol e digitou errado?] é o bruxo estrela da striga, corujas grito, ou bruxos italianos [que tradução, minha santa Tana]. Os árabes o chamavam de demônio pestanejante, e Grant (1991: 262) usa numerologia oculta para ligar essa estrela com Melquisedeque e a Fraternidade Branca [a Fraternidade Branca surgiu no Egito, quando Tutmosis III, ainda com o trono nas mãos da tia, ou melhor, com o traseiro da tia Hatshepsut ainda ocupando o trono, quis ter algo pra fazer e reuniu um bando de amigos ocultistas, que se dedicavam a estudar Magia e usavam um... misterioso pó branco pra aumentar a Visão. É, eu também pensei nisso que você está pensando, mas lembrei que a coca é uma planta americana. Então, eu estava lendo uma revista de arqueologia e encontrei a seguinte informação: traços de nicotina e cocaína foram encontrados na múmia de um faraó. Conclusão...] As estrelas Typhonianas de Escorpião, por outro lado, são tradicionalmente a resisdência assombrada do espírito alado familiar noturno Aquila Nigrans, ou L'Aigle Noir, a Águia Negra Fênix Nox (noite). Essa é a Águia Negra, um temmido emissário dos Grandes conhecido há tempos, nos mistérios da bruxaria verdadeira, como Corbeau Noir. De igual importância é outro pássaro celestial, Vega Alpha Lyrae, conhecido como o Abutre Curvo. No Egito, essa estrela foi associada a Maat, a deusa da verdade e consorte de Toth.Espero que essas poucas páginas dos grimórios divinos da sabedoria estrelada antiga tenham iluminado ainda mais o tema mítico deste livro enquanto chegamos ao fim de nossa jornada.

Elas são outro exemplo da transmissão da história antiga da extração da sabedoria Gnóstica dos Céus para o benefício da humanidade em luta por aqueles que ousaram desafiar a ordem cósmica [alguém mais tá lembrando dos Exilados de Capela?] Isso daria a impresssão de que a Gnose ou o autoconhecimento continuam sendo um problema para os inimigos da verdade e os pais da mentira em nosso mundo moderno. Apenas recentemente o arcebispo de Canterbury, dr. George Carey, um homem supostamente bem-educado, conednou a obsessão moderna com a eduação e a aquisição do conhecimento. Ele compara esse modismo com a heresia dos Gnósticos nos primeiros séculos do primeiro milênio cristão. O Igrejismo em suas muitas formas híbridas sempre se opôs à educação das massas e ao autoconhecimento do sagrado e do espiritual. Qualquer coisa que remova o papel da classe sacerdotal como um intermediário entre a humanidade e o Divino ameaça o monopólio espiritual da religião vigente. Ao longo de vários séculos sangrentos desde tempos remotos, as três religiões do Oriente Médio do Livro tentaram alcançar este fim empregando a espada, o laço e o fogo. MIlhares e milhares de seus oponentes foram mortos para encobrir o maior encobrimento e conspiração da história do mundo.

Hoje, quando celebramos o terceiro e último milênio cristão [Amém.], chegou a hora de a verdade ser contada. Este livro e outros que virão são parte desse processo em andamento. A Luz brilhará uma vez mais na escuridão em que estava escondida por séculos e afastará as sombras da ignorância.
A Luz está na Escuridão e a Escuridão é a Luz. #
Fim do texto.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Como nascem os Deuses Eu vi em um livro um texto da pesquisadora e terapeuta Mirella Faur sobre o nascimento dos Deuses e quero compartilha-lo com vocês: ''O panteão das tradições antigas resultou na interação dos dois princípios cósmicos universais: o masculinho, representado pelo Pai Céu, e o feminino, personificado pela Mãe Terra. O casamento sagrado desses dois polos gerou formas energéticas secundárias, polarizadas pela influência das forcas telúricas, cósmicas, planetárias e dos fenômenos da Natureza. Quando modeladas pela egrégora mental de um conjunto racial, tribal ou grupal, essas energias se manifestam como arquétipicos divinos, imbuídos de características e atributos específicos e com apresentações e nomes que variam conforme o lugar de origem. A existência e a sobrevivência dos arquétipicos de determinado panteão dependem da intensidade com que são cultuados e da duracao desse culto. Sem essa conexão e nutrição recíproca, as matrizes etéreas enfraquecem-se e acabam desaparecendo com o passar do tempo. Apesar de as divindades dependerem da egrégora humana, elas não são mero fruto de nossa imaginacao: são expressões reais de poderosos campos energéticos e vórtices de energia cósmica. Elas existem em uma realidade diferente do mundo tridimensional, chamada pelos xamãs de ''nagual'' ou ''realidade incomum'' (ou extrafísica), e tem o poder de existir e agir independentemente da vontade humana. Esses centros de energia cósmica, sutis e inteligentes, denominados divindades (sejam elas Deuses, vibrações originais, Devas ou Orixás), supervisionam o livre-árbitrio coletivo e auxiliam nas decisões tomadas pelos individuos, dentro dos limites, valores e regras do ambiente ao qual pertencem. Isso significa que elas nao interferem no livre-árbitrio, nem agem contra os interesses do agrupamento humano que as ''criou'' e que continua ''alimentando-as'' por meio de invocacoes, oferendas, cultos e rituais. 6 out (16 horas atrás) ϟ Tiago Existem uma necessidade de intercâmbio energetico permanente entre a origem e o resultado da criação, entre o criador e a criatura. Uma divindade deixará de existir apenas quando não tiver mais nenhum ser humanexpo que invoque sua presença ou acredite em sua existência. Quando isso ocorrer, o campo energético por ela representado não se extingue no espaço, mas se desloca ou volta á dua origem, podendo servir como substrato para a criação de um novo arquétipico, em lugar ou tempo diferente. Os Deuses e as Deusas não são arquétipicos estáticos, eles envoluem e se modificam de acordo com o progresso cultural e tecnológico e a trajetoria espiritual humana. As mudanças na percepção e interpretação de suas manifestações e a compreenção expandida de seus atributos e funções levam á readaptação dos mitos e a sua adaptação ás novas necessidades mentais, psicólogicas e socias da comunidade á qual pertencem. São as projeções e as formas mentais humanas que determinam a ''metamorfose'' das divindades, que acompanham, de maneira simbíotica, o desenvolvimento de seu povo e o surgimento de novos valores e hábitos comportamentais, morais e sociais. Compreende-se, assim, o porquê das diferenças nos mitos de um mesmo Deus ou deusa e os variados nomes a eles atribuidos''.

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

Deusa Deméter

Deméter

 
Deusa e mãe da terra cultivada foi compreendida pelos antigos como um equivalente de guê méter, “mãe-terra”. Como se trata de uma deusa, cujo culto era elevado muito a sério por todos os helenos, da Grécia continental à Magna Grécia e desta à Grécia asiática, divido este texto em três partes: na primeira parte, focalizarei na história do culto a esta deusa; na segunda parte, exponho, de maneira simples, o mito de Deméter, comentando o rapto de Perséfone; e na terceira parte, falo sobre os Mistérios de Elêusis, complementados por um simples estudo da parte simbólica, uma pequena síntese acerca do poder fixação dos alimentos e o esboço de uma pesquisa sobre alimentação e sexualidade.
1ª parte: Culto a Deméter
Os cultos mais antigos de Deméter foram afogados pelas invasões dóricas, segundo o historiador Heródoto (484 – 408 A.E.C.), a partir do século XII A.E.C. Ficaram, no entanto, alguns vestígios dessa fase antiga, particularmente na Arcádia, onde a deusa estava associada ao primitivo Posídon, o Posídon-Cavalo, bem com em Elêusis, segundo se verá em seguida. Nos arredores de Telpussa, querendo escapar do deus, que a perseguia, disfarçou-se em égua, mas Posídon, tomando a forma de um garanhão, fê-la mãe do cavalo Aríon e de uma filha, cujo nome só os Iniciados conheciam. O povo chamava-a simplesmente de Déspoina, a Senhora. Foi por causa da cólera, provocada por essa violência de Posídon, que a mãe de Aríon passou a ser denominada também de Deméter-Erínis. Recebeu, igualmente, o epíteto de Lúsia (a que se banha), pelo fato de ter-se purificado dos contatos do deus-cavalo no rio Ládon. Perto da Figalia, ainda na Tessália, chamavam-na Mélaina, a Negra, porque, em seu ressentimento, cobriu-se com véus pretos e retirou-se para o fundo de uma caverna, onde sua estátua era encimada por uma cabeça de cavalo. Em Fêneo ainda havia traço de mistérios primitivos, celebrados num antro rochoso, onde o sacerdote tirava de um esconderijo uma máscara de Deméter, dita Kidária, cobrindo o rosto e ferindo o solo com um bastão, rito destinado a provocar a fertilidade e evocar as forças ctônias. O termo grego kídaris designa uma espécie de turbante e o sobrenome Kidária poderia derivar de máscara, mas kídaris significa, outrossim, uma dança de Arcádia e a arte figurada deixa entrever que um coro bárbaro de sobrevivência zoomórfica não era estranho a esse culto primitivo. Ainda na Arcádia, as duas deusas, a dupla Deméter-Senhora, tinham características acentuadas de Pótnia Theron, “Senhora das feras”, associadas ao mundo animal e á fertilidade dos campos. Na região da Licúria (a montanha dos lobos) sua companheira era uma Ártemis arcaica. À dupla se ofereciam frutos diversos e animais não degolados, mas despedaçados vivos.
Um mito cretense, recolhido por Hesíodo, atesta que a grande deusa se uniu a Iásion sobre um terreno lavrado três vezes e que dessa ligação nasceu Plûtos. Existem algumas reminiscências de uma hierogamia à época das semeaduras e a idéia desse tipo de união rústica se encontra talvez na Deméter de Olímpia, denominada Caminéia, isto é, “que está na terra”. Sob esse epíteto se viu uma divindade oracular, mas que acabou sendo relacionada com o antigo hábito, segundo o qual o camponês e sua esposa dormiam sobre a terra que deveria ser cultivada, a fim de provocar a vegetação. Homero, na Odisséia, sem mencionar Pluto, refere-se à mesma tradição, ao dizer que o herói Iásion foi fulminado por Zeus, cujo mito olímpico, mais tarde codificado pelo mesmo Hesíodo, faz de Zeus esposo de Deméter, que dele teria tido Kóre, Core, a Jovem, ou Perséfone.
Os sofrimentos por que passou a deusa, quando sua filha, com o consentimento e ajuda do pai, foi raptada por Hades, são relatados no importantíssimo Hino homérico a Deméter, composto lá pelos fins do século VII A.E.C. e que, salvo um ou outro pormenor, pode e deve ser considerado como o hièro lógos, o “discurso sagrado” do Santuário de Elêusis. Nele a deusa augusta da terra é proclamada a maior fonte de riqueza e alegria. Com efeito, quando Deméter recuperou, por dói terços do ano, a companhia de Perséfone, a deusa devolveu (karpòn pherésbion) o grão da vida, que ela própria, em sua cólera dolorosa, havia escondido. Confiou-o, em seguida, a Triptólemo, que o Hino menciona apena acidentalmente entre os chefes de Elêusis. Mais tarde este herói se tornará filho de Metarina e Céleo, rei de Elêusis. Triptólemo recebeu a missão sagrada de levar o grão da vida a todos os povos e ensinar-lhes a prática do trabalho. A esses dons a deusa de Elêusis acrescentou uma recompensa suprema: no templo que Céleo lhe mandou construir, exatamente no local em que se asilou, Deméter instituiu para sempre belos e augustos ritos, penhor de felicidade na vida e para além da morte. Além do mais, as “duas deusas”, mãe e filha, a todos os homens piedosos, que as cultuam, enviam-lhes Pluto, o deus da riqueza agrária. Deméter é, pois, a Terra-Mãe, a matriz universal e mais especificamente a mãe do grão, e sua filha Core o grão mesmo de trigo, alimento e semente, que escondida por certo tempo no seio da Terra, dela novamente brota em novos rebentos, o que, em Elêusis, fará da espiga o símbolo da imortalidade.

Pluto é a projeção dessa semente. Se verdadeiramente o deus da riqueza agrária ficou eclipsado no Hino a Deméter é pela evocação patética de Core perdida e depois “re-encontrada”, uma estreita relação sempre existiu, desde tempos imemoriais, entre os cultos agrários e a religião dos mortos, e é assim que o Rico em trigo, Pluto, acabou por confundir-se com outro rido, o Rico em hóspedes, que se comprimem no palácio infernal. Pois bem, esse rico em trigo, com uma desinência inédita, se transmutou, sob o vocábulo (Plúton), Plutão, num duplo eufemístico e cultural de Hades.

Fundamentalmente agrária, o culto a Deméter está vinculado ao ritmo das estações e ao ciclo da semeadura e colheita para produção do mais precioso dos cereais, o trigo.

Bem antes da fusão com Atenas e comparativamente ao que representavam para a pólis de Péricles as festas em honra de Atená, sem dúvida as festas mais antigas de Deméter celebravam-se em Elêusis com o nome Eleusínias. Tratava-se de um ato de reconhecimento pelo “fruto de Deméter”, “por causa do fruto”, diz laconicamente Aristóteles, acrescentando, ademais disso, que as disputas atléticas, realizadas na ocasião, eram os mais antigos jogos da Grécia. Enquanto os vencedores nas Panatenéias eram recompensados com óleo das oliveiras sagradas de Atená, os atletas campeões nas Eleusínias recebiam como prêmio medidas de trigo sagrado, colhido das planícies de raros, perto de Elêusis, onde, pela primeira vez, Triptólemo plantou a semente sagrada. Vinculadas à cultura do trigo e aos trabalhos por ela requeridos, as festas da deusa de Elêusis se realizavam em datas apropriadas ás condições climáticas de Hélade. As Eleusínias, por sua finalidade mesma, se comemoravam pelos fins da primavera. Os outros ritos, bem mais conhecidos, se escalonavam em três etapas: o trabalho de preparação da terra; a semeadura e a colheita. O rito sagrado da lavoura, relembrava o trabalho inicial de Triptólemo, cujo nome significa popularmente o que revolve a terra três vezes, como trí-polos, “terra trabalhada três vezes”. Esse rito é mencionado em Esquíron, nos confins ático-eleusínios e nas planícies de Raros, onde residia a família dos Budzýgai, “os que atrelam os bois”, que possuía o privilégio de levar a bom termo esse rito sagrado, arando a terra ou mimando simplesmente a lavra e, além do mais, tinha a incumbência de manter os bois sagrados destinados a tal finalidade. De igual natureza eram as Proerósias, “sacrifícios antes da lavra”, festas instituídas posteriormente por Atenas, para atender a uma resposta do Oráculo de Delfos, quando de uma fome geral. Não havia, ao que parece, nas Proesórias, mímica da lavra, mas oferendas propiciatórias anuais em Elêusis, em nome de todos os gregos. O rapto e a ausência, a descida de Perséfone não se processaram no inverno, mas no retorno, a presença, a subida, ocupavam as duas outras partes do ano. A grande deusa iniciava seu esperado retorno após a aradura, no mês Pianépsion (segunda metade de outubro), com as Tesmófiras, a festa das semeaduras, e era “presença total”, realmente, à época da festa das Clóias, quer dizer, do “verde”, no mês Posídeon (dezembro), quando, após as chuvas do outono, o trigo e a cevada de Deméter-Cloe cobriam os campos com um manto “verde” e aqui permanecia até a colheita da última primavera, nos últimos dias do mês de Targélion (fins de maio) e início do mês de Esquirofórion (junho).

A coincidência desta heortologia (calendário de festas) com o clima mediterrâneo atesta que se está em presença de elementos indígenas anteriores à chegada dos gregos na Península. Além do mais, se os nomes Deméter e Core são gregos, Perséfone, que designa Core, após o rapto dessa última, não tem etimologia indo-européia. Até mesmo certas variantes do vocábulo, Perephóneia, Periphóna, Phrséphassa, Pherrpephatta, Phersephóna mostram a dificuldade que os gregos tiveram para adaptá-lo em sua língua. Trata-se, ao que tudo indica, de palavra de origem mediterrânea.

Difundidas por todas as regiões do mundo helênico, as mais antigas festas de Deméter são as Tesmofórias, palavra que se compõe de thesmós, “instituição sagrada da lei” e o verbo phérein, “levar, produzir” e, em sentido figurado, “estatuir, estabelecer”. Deméter thesmophóros é portanto a “legisladora”, porque, tendo ensinado os homens a cultivar os campos, instituiu o casamento, fundando, assim, a sociedade civil. As Tesmofórias são, por conseguinte, a festa das “legisladoras”, em que se agradece a Deméter pelas últimas colheitas.

Atribuídas por Heródoto às filhas de Dânao, as Danaides, as Tesmofórias eram reservadas às mulheres casadas, pela analogia óbvia entre a fecundidade do seio materno e a fertilidade da terra, que as mulheres estão muito mais aptas a promover. Isto explica provavelmente a preeminência da mulher no sacerdócio de Elêusis, tanto mais quanto da cidade santa dos Mistérios a sacerdotisa de Deméter sempre teve as honras da Eponímia.

As Tesmofórias, que duravam três dias, eram celebradas no mês de Pianépsion, segunda metade de outubro, quando os “poceiros” retiravam das fossas os restos dos leitões que aí haviam sido lançados, segundo a prática, cuja causa foi a desventura do porcariço Eubuleu. Jogavam-se leitões em fossas profundas, contava-se, como recordação da manada de porcos de Eubuleu, quase toda tragada, quando a terra se abriu no momento do rapto de Core. Recolhiam-se, em seguida, os restos, que eram misturados a grãos e sementes diversas: tal mistura era colocada sobre os altares e depois espalhada pelos campos. Tratava-se, claro está, de um rito de adubagem sagrada.

O segundo dia festivo das Tesmofórias denominava-se Nestéia, que quer dizer o “dia do jejum”, estomacal e sexual. Em Atenas, as mulheres formavam uma grande procissão e dirigiam-se para o Pnix, a oeste da Acrópole e passavam o dia todo e cabanas feitas de ramos, sentadas sobre folhas de loureiro, cujas virtudes fecundantes eram muito exaltadas pelos antigos. O jejum e a atitude dessas mulheres eram uma evocação de Deméter, prostrada de dor pelo desaparecimento da filha. Esse dia considerado nefasto.

As comemorações do terceiro dia das Tesmofórias denominavam-se Kalliguéneia, que quer dizer, literalmente, “belas gerações”, ou seja, abundantes colheitas. Oferecia-se à deusa uma panspermia, como nas Antestérias dionisíacas, uma espécie de sopa com uma mistura de todas as espécies de sementes, uma vez que pân é todo, total e spérma é semente. As Kalliguéneia transcorriam numa atmosfera de grande alegria e as mulheres casadas, de todas as idades, se entregavam a uma liberdade de gestos e de linguagem que fariam corar Aristófanes! Essa mesma quebra de interditos e “desrepressão” se verificam nas Haloas. Também as Kalliguéneias tinham por objetivo provocar a fertilidade do ser humano e dos campos.

Um pouco mais tarde, após as chuvas do outono, se dúvida do mês Posêidon, em dezembro, quando o trigo e a cevada cobriam a terra de verde, celebravam-se as festas denominadas Cloe (Khloîa), a verdejante, em honra ainda de Deméter, em Atenas e Elêusis.

Nos fins de maio, início de junho, isto é, nos meses de Targélion e Esquirofórion, realizavam-se as Thalýsia, “florir, cobrir-se de folhas, flores e frutos”. Nas Talísias ofereciam-se à divindade as primícias da colheita, hábito já registrado em Homero, mas a propósito de Eneu, rei Cálidon, terrivelmente castigado, porque esqueceu de Ártemis, quando ofereceu as primícias aos outros deuses. Na época clássica, as Talísias eram propriamente uma festa da eira, em honra de Deméter, quando a ela se ofereciam os primeiros grãos da colheita. Teócrito, o grande poeta grego da época alexandrina, no Idílio 7, cujo título é exatamente Talísias, se inspira poeticamente da festa e diz que “Deméter está corada de espigas e de papoulas vermelhas”.

A derradeira festa de Deméter denomina-se Haloas, ou seja, em princípio, uma festividade da deusa “guardiã dos celeiros”, mas essas comemorações celebravam também a outro grande deus da vegetação, Dioniso, que, sob muitos aspectos, está ligado à mãe de Perséfone.

As Haloas se desdobravam, portanto, numa festa da uva, quando se realizava a segunda cava às vinhas, o adubamento das cepas e a degustação do vinho novo, cuja primeira fermentação já havia terminado. Como se tratava de uma festa de Deméter, embora extensiva a Dioniso, a presença da mulher, ao menos em algumas partes da festividade, conferia-lhe um regozijo especial e uma atmosfera de luxúria báquica. Boas apreciadoras também do néctar dioisíaco, as mulheres, mais que nas Kalliguéneia, entregavam-se à gracejos licenciosos e a gestos ousados, que a lei admitia e de que fala Aristóteles na Política (7, 1336 b 17), como assunto superado, por seu caráter ritual.

2ª parte: O mitologema de Deméter e Perséfone

De Homero a Pausânias multiplicaram-se as variantes deste mito.

Deusa maternal da Terra, sua personalidade é simultaneamente religiosa e mítica, bem diferente da deusa Gaia (Géia), concebida como elemento cosmogônico. Divindade da terra cultivada, a filha de Crono e Réia é essencialmente a deusa do trigo, tendo ensinado aos homens a arte de semeá-lo, colhê-lo e fabricar o pão. Tanto no mito quanto no culto, Deméter está indissoluvelmente quase sempre denominada simplesmente As Deusas. As aventuras e os sofrimentos das Deusas constituem o mito central, cuja significância profunda somente era revelada aos Iniciados nos Mistérios de Elêusis. Core crescia tranqüila e feliz entre as ninfas e em companhia de Ártemis e Atená, quando um dia seu tio Hades, que a desejava, a raptou com o auxílio de Zeus. O local varia muito, segundo as tradições: o mais correto seria a pradaria de Ena, na Sicília, mas o Hino homérico a Deméter fala vagamente da planície de Misa, nome de cunha místico, inteiramente desprovido de sentido geográfico. Outras variantes colocam-no ora em Elêusis, às margens do rio Cefiso, ora na Arcádia, no sopé do monte Cilene, onde se mostrava uma gruta, que dava acesso ao Hades, ora em Creta, bem perto de Cnossos. Core colhia flores e Zeus, para atraí-la, colocou um narciso ou um lírio às bordas de um abismo. Ao aproximar-se da flor, a Terra se abriu, Hades ou Plutão apareceu e a conduziu para o mundo ctônio.

Desde então começou para a deusa a dolorosa tarefa de procurar a filha, levando-a a percorrer o mundo inteiro, comum archote aceso em casa uma das mãos. No momento em que estava sendo arrastada para o abismo, Core deu um grito agudo e Deméter acorreu, mas não conseguiu vê-la, e nem tampouco perceber o que havia acontecido. Simplesmente a filha desaparecera. Durante nove dias e nove noites, sem comer, sem beber, sem se banhar, a deusa errou pelo mundo. No décimo dia encontrou Hécate, que também ouvira o grito e viu que a jovem estava sendo arrastada para algum lugar, mas não lhe foi possível reconhecer o raptor, cuja cabeça estava cingida com as sombras da noite. Somente Hélio (o Sol), que tudo vê, e que já, certa feita, denunciara os amores secretos de Ares e Afrodite, cientificou-a da verdade. Irritada contra Hades e Zeus, decidiu na mais retornar ao Olimpo, mas permanecer na terra, abdicando de suas funções divinas, até que lhe devolvessem a filha.

Sob o aspecto de uma velha, dirigiu-se a Elêusis e primeiro sentou-se sobre uma pedra, que passou, desde então, a chamar-se Pedra sem Alegria. Interrogada pelas filhas do rei local, Céleo, declarou chamar-se Doso e que escapara, há pouco, das mãos de piratas de que a levaram, à força, da ilha de Creta. Convidada para cuidar de Demofonte, filho recém-nascido da rainha Metanira, a deusa aceitou a incumbência. Ao penetrar no palácio, todavia, sentou-se num tamborete e, durante longo tempo, permaneceu em silêncio, com o rosto coberto por um véu, até que uma criada, Iambe, fê-la rir, com seus chistes maliciosos e gestos obscenos. Deméter não aceitou o vinho que lhe ofereceu Metanira, mas pediu que lhe preparassem uma bebida com sêmola de cevada, água e poejo, denominada kykeón, “agitar de modo a misturar, perturbar agitando”, onde cíceon, além de “mistura” significa também “agitação, perturbação”. Trata-se, ao que parece, de uma bebida mágica cujos efeitos não se conhecem bem.

Encarregada da educação do caçula Demofonte, “o que brilha entre o povo”, a deusa não lhe dava leite, mas após, esfregá-lo com ambrosia, o escondia, durante a noite, no fogo, “como se fora um tição”. A cada dia, o menino se tornava mais belo e parecido com um deus. Deméter realmente desejava torná-lo imortal e eternamente jovem. Uma noite, porém, Metanira descobriu o filho entre as chamas e começou a gritar desesperada. A deusa interrompeu o grande rito iniciático e exclamou pesarosa: “Homens ignorantes, insensatos, que não sabeis discernir o que há de bom ou de mal em vosso destino. Eis que tua loucura de levou à mais grave das faltas! Juro pela água implacável do Estige, pela qual juram também os deuses: eu teria feito de teu filho um ser eternamente jovem e isento da morte, outorgando-lhe um privilégio imorredouro. A partir de agora, no entanto não poderá escapar do destino da morte” (Hh. D., 256 – 262). Surgindo em todo seu esplendor, antes de deixar o palácio, que se lhe erguesse um grande templo, com um altar, onde ela pessoalmente ensinaria seus ritos aos humanos. Encarregou, em seguida, Triptólemo, irmãos mais velho de Demofonte, de difundir pelo mundo inteiro a cultura do trigo.
Construindo o santuário, Deméter recolheu-se ao interior do mesmo, consumida pela saudade de Perséfone. Provocada por ela, uma seca terrível se abateu pela terra. Em vão Zeus lhe mandou mensageiros, pedindo que regressasse ao Olimpo. A deusa respondeu com firmeza que não voltaria ao convívio dos Imortais e bem tampouco permitiria que a vegetação crescesse, enquanto não lhe entregassem a filha. Como a ordem do mundo estivesse em perigo, Zeus pediu a Plutão que devolvesse Perséfone. O rei dos Infernos curvou-se à vontade soberana do irmão, mas habilmente fez que a esposa colocasse na boca uma semente de romã e obrigou-a a engoli-la, o que a impedia de deixar a outra vida. Finalmente, chegou-se a um consenso: Perséfone passaria quatro meses com o esposo e oito com a mãe.

Reencontrada a filha, Deméter retornou ao Olimpo e a terra cobriu-se, instantaneamente, de verde. Antes de seu regresso, porém, a grande deusa, ensinou todos os seus mistérios ao rei Céleo, a seu filho Triptólemo, a Díocles e a Eumolpo “os belos ritos, os ritos augustos que é impossível transgredir, penetrar ou divulgar: o respeito pelas deusas é tão forte, que embarga a voz” (Hh. D., 476 – 479).

A instituição dos Mistérios de Elêusis explica-se, pois, pelo reencontra das duas deusas e como conseqüência do fracasso da imortalização de Demofonte. A esse respeito, comenta agudamente Mircea Eliade:

“Pode-se compara a história de Demofonte com os velhos ritos de relatam o trágico erro que, em certo momento da história primordial, anulou a possibilidade de imortalização do homem. Mas, nesse caso, não se trata do erro ou do ‘pecado’ de um antepassado mítico que perde para si e para seus descendentes a condição primeira de imortal. Demofonte não era uma personagem primordial; era o filho caçula de um rei. E pode-se interpretar a decisão de Deméter de imortalizá-lo como o desejo de ‘adotar’ um filho (que a consolaria da perda de Perséfone) e, ao mesmo tempo, como uma vingança contra Zeus e os Olímpicos. Deméter estava transformando um homem em deus. As deusas possuíam esse poder de outorgar a imortalidade aos humanos, e o fogo ou a cocção do neófito figuravam entre os meios mais reputados. Surpreendida por Metanira, Deméter não escondeu sua decepção diante da estupidez dos homens. Mas o hino não faz qualquer referência à eventual generalização dessa técnica de imortalização, isto é, a fundação de uma instituição suscetível de transformar os homens em deuses por intermédio do fogo”.

Na realidade, Deméter só se identificou e pediu que se lhe erguesse um templo após o fracasso da imortalização de Demofonte, mas somente transmitiu seus ritos secretos depois de seu reencontro com a filha. Não existe, pois, objetivamente, nenhuma relação entre a iniciação nos Mistérios e a cocção de Demofonte, interrompida por Metanira. O iniciado nos Mistérios não conseguia e nem pretendia a imortalidade. É bem verdade que, ao fim das cerimônias nos Mistérios, o templo inteiro era iluminado por milhares de archotes, mas esse clarão, “esse fogo”, simbolizava, tudo leva a crer, a iluminação interior dos iniciados e a certeza das luzes da outra vida. O pouco que se conhece das cerimônias secretas deixa claro que o mistério central envolvia a presença de duas deusas e que sua fundamentação era a morte simbólica, a descida de Perséfone e seu retorno triunfante, como a semente que morre no seio da terra e se transmuta em novos rebentos. E se através da iniciação a condição humana era modificada, isso se fazia num sentido bem diferente do da fracassada imortalização de Demofonte. O que os Mistérios prometiam era a bem-aventurança após a morte. Os textos a esse respeito são muito escassos, mas expressivos.

O próprio Hino a Deméter promete a felicidade para os Iniciados e indiretamente o castigo para aqueles que ignoram os Mistérios:



Feliz aquele que possui, entre os homens da terra, a visão destes Mistérios.
Ao contrário, aquele que não foi iniciado e aquele que não participou dos santos
ritos não terão, após a morte, nas trevas úmidas, a mesma felicidade do
iniciado.
(Hh. D., 480 – 482)
Em um de seus Trenos, fr. 6 (e não 10, como erradamente consta em Mircea Eliade) exclama o maior dos líricos da Hélade:



Feliz aquele que, antes de baixar á terra, contemplou este espetáculo. Ele
conhece qual é o fim da vida e também o começo, outorgado por Zeus.
Sófocles, fr. 753, o trágico maior, trouxe também a sua contribuição:



Bem-aventurados os mortais que, após terem contemplado os Mistérios, vão
descer à outra vida. Ali, somente eles viverão; os outros só terão
sofrimentos.
Na comédia de Aristófanes, As Rãs, 154 – 159, Héracles (Hércules, em Roma), ensinando a Baco o caminho que levava ao Hades, fala de um pequeno encontro de Dioniso com a alegria dos Iniciados na outra vida:

Héracles – Prosseguindo, envolver-te-á um sopro de flautas. Divisarás
uma esfusiante claridade, como aqui; encontrarás bosques de mirto, grupos
bem-aventurados de homens e mulheres e um estrepitoso bater de palmas.
Baco
– quem são estes?
Héracles – Os Iniciados.
[1]

Seja como for, como diz Mircea Eliade, o rapto, quer dizer, a “morte” simbólica de Perséfone, trouxe para os homens benefícios incalculáveis. Uma deusa olímpica, que passa a habitar apenas uma terça parte do ano o mundo dos mortos, encurta a distância entre os dois reinos: o Hades e o Olimpo. Como ponte entre os dois “mundos divinos”, podia intervir no destino dos homens mortais.

Os Mistérios de Elêusis vão ter exatamente por essência essa morte simbólica, projetava na morte e na ressurreição da semente.

3ª parte: os Mistérios de Elêusis

Acerca dos Mistérios de Elêusis o que se sabe é tão-somente o exterior e, mesmo assim, fragmentariamente. Os documentos literários e a arte figurada aludem particularmente à preparação das etapas da iniciação, o que, é claro, não exigia segredo. Assim mesmo Ésquilo, segundo Aristóteles, teria revelado, sem o querer, certos aspectos secretos relativos aos Mistérios e converter-lhes os adeptos, se não dissessem o que realmente acontecia, correriam o risco de ser desmentidos. Essas informações, porém têm que ser analisadas com muita prudência, porque, se de um lado são muito incompletas e reticentes, sem penetrar no âmago da questão, e a prudência assim o aconselhava, de outro, baseiam-se, não raro, em “mistérios tardios”, da época helenística. Em dois mil anos de funcionamento em Elêusis, é muito provável que os Mistérios tenham sofrido influências de outras correntes religiosas e que certas cerimônias se tenham modificados com o correr dos anos.
No tocante ás informações dos “pagãos”, também elas, e com muito mais razão, pecam pela base: abordam tão-só aspectos externos, quando não se baseiam em épocas tardias, e, pior ainda, quando não confundem Mistérios de Elêusis com Orfismo.



Aristófanes. As Rãs. Tradução de Junito de Souza Brandão. Rio de Janeiro, Ed. Espaço & Tempo, 1987.